Caso Boate Kiss: Justiça anula júri que condenou quatro réus por incêndio em boate

A 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul anulou nesta quarta-feira (3/8) o júri que condenou quatro pessoas envolvidas na tragédia da Boate Kiss. Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão foram condenados por homicídio e tentativa de homicídio simples com dolo eventual pelas 242 mortes e mais de 600 feridos causados pelo incêndio da casa noturna, em Santa Maria (RS), na madrugada de 27 de janeiro de 2013.

A anulação foi estabelecida por dois votos a um. O relator do recurso, desembargador Manuel José Martinez Lucas, afastou as teses das defesas dos réus e votou contra o pedido de nulidade. Os desembargadores José Conrado Kurtz de Souza e Jayme Weingartner Neto, contudo, reconheceram algumas alegações e votaram pela anulação do julgamento.

Entre as nulidades acolhidas, está a falta de igualdade de condições entre defesa e acusação durante o processo. “O nosso dever é avaliar se a condenação se sustenta juridicamente”, afirmou Weingartner Neto.

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Apesar de votar contra a anulação, o relator classificou a decisão de prender os réus como “esdrúxula”. Eles foram presos graças a uma decisão do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, que concedeu medida cautelar em suspensão de liminar para derrubar a decisão do desembargador José Manuel Martinez Lucas, do TJ-RS, que deferiu liminar em Habeas Corpus para impedir o juiz de primeiro grau de determinar a prisão imediata dos quatro acusados.

Especialistas ouvidos pela ConJur afirmaram, na época, que a decisão do presidente do Supremo era ilegal e inconstitucional. Isso porque a suspensão de liminar não pode ser usada para anular Habeas Corpus e a decisão teria violado a presunção de inocência.

Direito de defesa
Na opinião do criminalista Alberto Toron, a anulação do júri é muito importante para reafirmar a amplitude do direito de defesa. “A acusação não pode mudar os termos constantes na denúncia em plena realização do julgamento pelo júri. Ali a acusação era de que eles haviam tido uma conduta dolosa, e durante os debates o promotor afirmou que eles agiram de forma omissiva. Essa mudança cerceia a defesa”, explica ele.

Outra nulidade apontada pelo advogado foi a redação do quesitos. “Mas o mais importante desse caso é que ele resgata a sabedoria do TJ-RS, que, antevendo essas e outras questões, determinou que os réus aguardassem o julgamento em liberdade. Coisa que de forma truculenta até não foi permitida por decisão do ministro presidente do Supremo Tribunal Federal”.

Rodrigo Faucz, advogado criminalista e pós-doutor em Direito (UFPR), destaca algumas nulidade reconhecidas pelo TJ-RS como a quantidade de sorteios de jurados. Foram três e o último sorteio ocorreu faltando apenas quatro dias úteis para o julgamento.

“O Código de Processo Penal exige que o sorteio seja realizado no máximo em até dez dias úteis. Fazer o sorteio tão próximo da data do júri impede que a defesa possa fazer uma análise dos nomes a fim de eventualmente afastar aqueles que estariam impedidos ou que seriam parciais”, explica.

Ele também destacou que ficou evidente que o Ministério Público teve vantagens competitivas em relação à defesa, uma vez que teve acesso a inúmeros bancos de dados para análise dos jurados.

Por fim, ele explica que com a decisão os réus devem ser soltos imediatamente. “Considerando que a prisão determinada pelo Min. Luiz Fux era fundamentada na condenação dos acusados, com a anulação do julgamento, não existe mais fundamento para a privação de liberdade”, resumiu.

 

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